Kintsugi

26/08/2019

A vida é assim mesmo, ainda que sem querer, ela vai quebrando nosso coração em diferentes situações e de diversas maneiras. E com o tempo fui aprendendo a admirar a beleza dos cacos; dos reflexos repetidos de sentimentos destruídos nos estilhaços espalhados pelo caminho. Algumas vezes até mosaicos eu cheguei a criar. Porém, em muitos casos podemos os consertar. Eu descobri que cacos também são passíveis de se reparar.

    Os japoneses têm uma técnica de reparo chamada kintsugi. Eles utilizam ouro, laca e outros materiais para consertar cerâmicas danificadas. Segundo a tradição, o shogun Ashikaga Yoshimasa, enviara uma peça quebrada para ser consertada na China, em razão de ter sido lá onde a mesma fora comprada. Todavia, o objeto retornou com uma aparência desagradável, motivando, assim, o shogun a pedir a artesãos japoneses que refizessem o reparo. Estes, fazendo uso de pó de ouro e outras misturas, conseguiram trazer ainda mais beleza para o artefato.

    O kintsugi deve ser encarado não só como uma arte de reparo e valorização, mas também uma filosofia de vida. Não sei se percebeu, entretanto, dá para fazermos o mesmo com o coração e nossos relacionamentos, os consertar usando as experiências que adquirimos como ouro e laca para juntar os pedaços. Alguns reparos são mais rápidos, outros são um pouco mais demorados... Não importa o tempo, mas tão somente que há conserto.

   Seja num relacionamento, no trabalho, na família ou com amigos, um dano ou uma rachadura não obrigatoriamente significam o fim. A gente tem que parar de idealizar relações e superestimar a perfeição. Pra mim, o kintsugi pode ser definido como sinônimo de amor. Quem ama, seja a algo, alguém ou a si, conserta - repara, conversa - muda, melhora - pede desculpas, se desculpa. Com o advém da maturidade passamos a encarar as cicatrizes com as graças que lhe são próprias, aceitando e celebrando as imperfeições intrínsecas a tudo que compõe as relações humanas. Cada marca traz consigo uma lição e uma superação.

    Indiscutivelmente, com a liquidez peculiar da contemporaneidade, é mais fácil e prático buscarmos comprar um objeto novo quando o antigo vem a se danificar; terminar um relacionamento do que tentar mudar; se distanciar do que diverge em vez de dialogar... Contudo, na maioria das vezes, sem dúvidas estas opções não são as mais certas a se tomar. Busque exercitar o kintsugi, tanto na vida, como no coração.

    Não sei se você partilha da mesma visão, mas eu sei de uma coisa: não custa nada tentar o aplicar.

Rones Farias Filho,

@ronesff | @sintaxelivre

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